Foi assim: estávamos com vontade de mudar de casa, queríamos uma com paredes de uma cor só, melhor que a nossa, mais perto das minhas clientes e do trabalho do meu marido um requisito importante nunca mencionado por ele mas que se eu pensasse um pouquinho poderia supor que é a sala quadrada, com boa acústica. Numca se falou que a casa seria num bairro tranquilo. Isso era natural, mas praticamente impossível por uma razão: aluguel mais barato. Ondde é que se consegue isso? Num bairro desvalorizado, óbvio.

Eis que viemos parar no lugar mais malfalado da cidade vizinha. Gostamos de casa e decidimos nos mudar.

Quando decidimos, eu fiquei várias noites sem dormir direito, sonhava com os bandidos, com minhas crianças e com os amigos do meu ex-marido. Nossos amigos também ficaram apreensivos. Minha irmã me perguntou o que eu faria com os tiroteios, com as ruas fechadas pela polícia, com a falta de liberdade. Quase enlouqueci me preocupando.

Fiquei mais de um mês sem ouvir um único tiro. Tudo me parecia normal, alguns mal-encarados passando pela gente, essas coisas.

Notei carros entrando e saindo em pouco tempo. Boca? Mais tarde, fiquei sabendo que o entra e sai era na casa da fornecedora de sorvete. Ufa!

Tentaram arrombar a casa da minha irmã, no centro. E eu aqui, ao lado da bandidagem.

Mas agora a euforia passou, não estou anesisiada e ouvimos um tiro de manhã. Eu me pergunto o que leva uma pessoa a "emitir" um único tiro. Ouvi outros há pouco, enquanto continuava divagando sobre a questão.

Não vou sair de carrinho com minha filha. E nem celebrar o fato de estar vivo como fazem as pessoas que moram aqui ficando na rua. Elas acham que se não morrem de bala perdida, estão livres de morrerem atropeladas.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Como cada signo troca uma lâmpada

Agora é certo, fato, fatíssimo